Estudo revela impactos ambientais das fábricas de celulose em Três Lagoas e região

Thais Dias

Um abrangente estudo conduzido pelo gestor ambiental Valticinez Barboza Santiago expõe os profundos impactos ambientais, econômicos e sociais da silvicultura no leste de Mato Grosso do Sul, com foco especial em Três Lagoas, polo da indústria de celulose, e Inocência, onde a multinacional chilena Arauco avança com novos plantios de eucalipto. A pesquisa revela um cenário de desigualdades regionais, onde os benefícios econômicos se concentram em poucas mãos, enquanto os custos ambientais se espalham por toda a região.

A pesquisa destaca como o atual modelo de produção concentra os benefícios econômicos em Três Lagoas, enquanto os custos ambientais e sociais recaem sobre os municípios produtores como Inocência e Selvíria. O levantamento de Valticinez Santiago identificou que, embora o eucalipto seja cultivado em diversas cidades da região, o ICMS gerado pela industrialização fica concentrado em Três Lagoas, criando um desequilíbrio fiscal.

Em Inocência, a chegada da Arauco traz preocupações ambientais, com o estudo apontando riscos de redução hídrica em 350 nascentes já mapeadas como degradadas na região. A pesquisa também mostra que Selvíria, com mais de 101 mil hectares de eucalipto, já perdeu cerca de 70 mil cabeças de gado devido à conversão de pastagens.

O estudo argumenta que a legislação atual, que dispensa licenciamento municipal para plantios de eucalipto, precisa ser revisada para garantir maior controle local sobre os impactos ambientais e distribuição mais justa dos benefícios econômicos, protegendo tanto os recursos naturais quanto as economias municipais afetadas pela expansão da silvicultura.

Em entrevista ao Expressão MS, Santiago foi enfático: “Não somos contra o progresso, mas as leis precisam ser revistas. As empresas devem compensar os municípios que fornecem a matéria-prima e assumir a recuperação ambiental”.

Ele propõe mudanças na legislação para garantir distribuição mais justa dos recursos tributários, proteção efetiva das nascentes e recursos hídricos, maior poder de regulamentação para os municípios.

Gestor ambiental Valticinez Barboza Santiago

O debate revela um dilema estadual: como equilibrar o desenvolvimento econômico trazido pelas indústrias de celulose, com a preservação ambiental e a justiça social nas regiões fornecedoras de matéria-prima? 

Três Lagoas e sua história com a celulose

O município de Três Lagoas se transformou, nas últimas duas décadas, em um dos principais polos de produção de celulose do país. Tudo começou em 2009, quando a Fibria (atual Suzano) inaugurou sua primeira fábrica no local, atraída pela abundância de terras planas, clima favorável e logística privilegiada. Com investimentos bilionários, a unidade se tornou uma das maiores do mundo em capacidade produtiva.

Em 2018, a Eldorado Brasil Celulose, controlada pelo grupo J&F, entrou em operação na mesma região, consolidando Três Lagoas como a capital nacional da celulose. Juntas, as duas fábricas empregam milhares de trabalhadores e respondem por uma fatia significativa das exportações do estado.

Porém, o estudo de Valticinez Santiago revela que esse crescimento tem um custo oculto:

Concentração tributária: Enquanto o eucalipto é plantado em diversos municípios vizinhos, como Selvíria, Inocência e Ribas do Rio Pardo, o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) é gerado apenas em Três Lagoas, onde ocorre a industrialização. Isso, conforme Santiago, cria um desequilíbrio fiscal, onde cidades fornecedoras de matéria-prima não recebem compensação justa.

Além dos Impacto na pecuária, como por exemplo em Selvíria, onde o avanço dos eucaliptais já reduziu o rebanho bovino em 70 mil cabeças, com pastagens sendo convertidas em monocultura. A Pressão hídrica é outro agravante, ora visto que as fábricas demandam grandes volumes de água, e o estudo alerta para o risco de estresse hídrico na região.

Enquanto Três Lagoas já consolida sua posição no setor, Inocência se prepara para entrar no mapa da celulose com a chegada da Arauco, gigante chilena do setor florestal. A empresa adquiriu vastas áreas no município e planeja expandir seus plantios de eucalipto, visando alimentar futuras operações industriais.

O estudo, no entanto, faz alertas importantes sobre esse avanço, o levantamento já identificou 350 nascentes comprometidas na região devido ao avanço da silvicultura. “Com a Arauco ampliando sua presença, o risco de redução hídrica aumenta”, ressalta Santiago.

Além da falta de compensação municipal, como ocorre em outros municípios, Inocência pode acabar fornecendo matéria-prima sem receber uma parcela justa dos royalties e impostos gerados pela atividade. O estudo também leva em conta a mudança no perfil econômico da cidade que antes era dominada pela pecuária e a agricultura familiar, que podem perder espaço para o eucalipto, alterando drasticamente a economia local.

Vale ressaltar que o estudo não se opõe ao desenvolvimento da silvicultura, mas defende mudanças urgentes na legislação para garantir a distribuição equitativa dos recursos. Criar mecanismos para que municípios produtores de eucalipto recebam parte dos impostos gerados pela industrialização em Três Lagoas e criar uma proteção hídrica, onde irá exigir que empresas reflorestadoras assumam a recuperação e preservação de nascentes, além do licenciamento municipal que irá dar mais poder às prefeituras para regulamentar o plantio de eucalipto em seus territórios.

Assembleia Legislativa

O estudo realizado por Valticinez Santiago foi apresentado aos deputados estaduais na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, através da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.

Veja matéria sobre o assunto gerada pela TV Assembleia:

 

 

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