Setor enfrenta retração acentuada devido aos juros elevados, com volume de recursos liberados sendo o mais baixo dos últimos seis anos
O mercado imobiliário de Mato Grosso do Sul segue em trajetória de retração no volume de financiamentos habitacionais com recursos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). Dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) mostram que, entre janeiro e junho deste ano, foram financiadas 2.069 unidades no Estado, somando R$ 698,5 milhões.
O montante representa queda de 23,6% em relação ao mesmo período de 2024, quando os financiamentos chegaram a R$ 914,9 milhões, e redução ainda mais acentuada em relação a 2022, quando os valores superaram R$ 1,29 bilhão. Na comparação com o ano passado, a queda foi de 46%.
O principal fator que explica a retração é o patamar elevado da taxa básica de juros (Selic), que encarece o crédito imobiliário e afasta potenciais compradores. O economista Wagner Bertoldo explica que o objetivo da taxa de juros é conter o consumo e, consequentemente, a inflação.
“Então, essa contenção do consumo também abrange bens duráveis, não só o consumo das pessoas físicas em produtos e serviços. Afeta o investimento em bens duráveis, ao passo que restringe e desestimula a financiar através do financiamento de bancos”, detalha.
Segundo levantamento da Abecip, a taxa média de juros do financiamento imobiliário no País se manteve acima de dois dígitos no período, variando entre 10% e 11% ao ano. Esse patamar é considerado elevado quando comparado aos anos de maior aquecimento do setor, como 2020 e 2021, quando o crédito imobiliário operava próximo de 7% ao ano.
Os dados da Abecip apontam ainda que o primeiro semestre deste ano foi o pior dos últimos seis anos para o financiamento imobiliário no Estado. Na série histórica, em 2020, primeiro ano da pandemia, foram financiadas 2.395 unidades e R$ 569,820 milhões.
Em 2021, foram contratados R$ 1,13 bilhão via SBPE, em 4.496 unidades. No ano seguinte, o volume disparou para R$ 1,29 bilhão, distribuído em 4.531 imóveis financiados. Já em 2023, a cifra recuou para R$ 936 milhões, em 3.236 contratos. No ano passado, houve leve recuperação, com R$ 914 milhões liberados para 2.931 unidades.
Ao observar mês a mês, percebe-se a instabilidade do mercado. Em janeiro, foram financiados 351 unidades em Mato Grosso do Sul, totalizando R$ 130,5 milhões. Fevereiro registrou crescimento, com 542 imóveis financiados e R$ 143,3 milhões liberados.
Contudo, março apresentou forte queda, apenas 279 unidades, somando R$ 101,4 milhões. Em abril houve ligeira recuperação, mas os resultados voltaram a cair em maio e junho, encerrando o semestre em baixa. O último mês analisado foi o pior do ano, com apenas R$ 91,1 milhões liberados – menos da metade do registrado em junho de 2024.
Outros fatores que impactam o crédito
O presidente do Sindicato da Habitação de Mato Grosso do Sul (Secovi-MS), Geraldo Paiva, lembra que a própria fonte dos recursos influencia nesse cenário. “A principal fonte de recurso do SBPE é o depósito em caderneta de poupança, que vem caindo junto aos agentes financeiros, por conta da baixa remuneração da poupança ante os juros de mercado”.
Já o economista Renato Gomes apontou outro fator que limita a queda das taxas. “Primeiro, a queda da taxa básica de juros não veio muito acentuada e, depois, porque a poupança, que é um grande canal de financiamento imobiliário no País, está sofrendo uma tendência de resgates”.
Reflexos na economia e perspectiva para o comprador
O desempenho do financiamento habitacional é um dos termômetros da atividade imobiliária e, por consequência, da construção civil. Com menos contratos fechados, o ritmo de lançamentos tende a diminuir, assim como a geração de empregos diretos e indiretos.
O diretor do Conselho Regional de Corretores de Imóveis de Mato Grosso do Sul (Creci-MS), Luiz Gomes Dias, destacou os efeitos para o consumidor. “Com os juros mais altos, o crédito fica mais caro, o valor total financiado sobe e a parcela mensal pode pesar mais no orçamento”.
Apesar das dificuldades, a compra do imóvel continua sendo vista como prioridade para muitas famílias. “Quem está se planejando para comprar o primeiro imóvel precisa ter a clareza de que esse é um investimento de longo prazo. Mesmo com juros altos agora, é possível aproveitar imóveis com preços mais acessíveis e, mais para a frente, quando as taxas baixarem, migrar o financiamento para condições melhores através da portabilidade”, aconselha Dias.
A expectativa do setor é de que a continuidade do ciclo de queda da Selic pelo Banco Central possa reaquecer gradualmente o mercado de crédito imobiliário no segundo semestre.