Após uma trajetória de queda nos preços, o consumidor pode esperar uma tendência de aumento, especialmente dos alimentos, neste último trimestre. Alimentos como a carne bovina, o café e alguns itens do setor hortifrutigranjeiro devem pressionar a inflação oficial nos próximos dois meses.
O bom desempenho das safras agrícolas, o alerta de gripe aviária, o câmbio e o tarifaço dos Estados Unidos que inicialmente ampliou a oferta de alimentos no mercado doméstico foram imprescindíveis para uma leve queda nos preços da comida. De junho a setembro, o grupo alimentação no domicílio, do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), registrou deflação, como reflexo do recuo dos preços no atacado que houve nos meses anteriores.
“Observamos uma redução na inflação dos alimentos no mês de setembro, apesar de ter subido o IPCA. Enquanto o IPCA subiu 0,48%, a inflação dos alimentos caiu um pouquinho, em torno de 0,41%. Mas a gente não sente muito isso no consumidor final, na gôndola, principalmente porque nós já viemos de uma alta de preços que dura bastante tempo”, explica o doutor em Administração, Leandro Tortosa.
Na avaliação do professor, a inflação acaba sempre pesando muito mais no bolso do consumidor que tem baixa renda, do que no de quem tem uma renda mais elevada. Entre os alimentos, alguns produtos já mostram esse comportamento no mercado. “O ovo de galinha, por exemplo, já vem numa alta acumulada de muito tempo, e apesar dele ter caído por volta de 2,84%, você ainda não tem um impacto muito forte na mesa do consumidor. Outra coisa, teve também ali redução de tomate, uma redução expressiva, 11,5%, cebola, 10%, alho e batata-inglesa. Por outro lado, a gente teve aumento aqui no preço do limão, da manga, do óleo de soja, da banana-prata e do mamão”, elenca.

Conforme reportagem do Estadão, o economista da 4intelligence, Fabio Romão, projeta que o grupo alimentação no domicílio deve acumular alta de 3,22% neste ano, o segundo maior resultado em cinco anos, e acima da sazonalidade do período. A mediana da variação desse grupo de preços entre 2011 e 2024 foi de 2,40%. No entanto, no último trimestre de 2024, a inflação da alimentação no domicílio subiu 4,26%, afetada pela forte estiagem. O grupo alimentos e bebidas acumula alta de 6,78% em Campo Grande, nos últimos 12 meses, enquanto a média nacional é de 6,61%. Considerando somente a alimentação no domicílio a alta em MS é de 6,54%, ante a média nacional de 5,99%.
Para o economista Eduardo Matos, o quadro inflacionário se insere em um contexto maior, que persiste desde o período pós-pandemia, quando as medidas sanitárias passaram a ser flexibilizadas com a vacinação. Dessa forma, o fim deste ano, portanto, se torna um período decisório para a retomada das pressões inflacionárias. “A pandemia, claro, foi o principal fator que causou essa pressão inflacionária que persiste, no entanto, é o que nós chamamos de ‘tempestade’ perfeita. A economia brasileira vinha embalada, principalmente aqui na região Centro-Oeste e Mato Grosso do Sul. Aqui temos, sobretudo, um ritmo de industrialização bastante avançado, principalmente da agroindústria, que demanda também bastante dos alimentos que são produzidos aqui”, detalha.
Além dos fatores internos, os especialistas também citam que as tarifas impostas ao Brasil pelos Estados Unidos, em agosto, são outros fatores que também impulsionam uma nova tendência de alta. “Agora, nós temos um quadro, passamos por uma situação em que essa pressão inflacionária foi um pouco arrefecida, isso porque aumentou a disponibilidade de artigos de consumo no mercado interno, no mercado doméstico, da soja, do leite, da carne, que são itens com grande peso na cesta básica do brasileiro. Eles não puderam, em grande volume, serem exportados para os Estados Unidos, então a disponibilidade interna aumentou, a oferta aumentou e, no preço, a tendência foi de queda. No entanto, nós sabemos que essas medidas, principalmente essas medidas de cunho comercial e de cunho diplomático não se sustentam em uma economia extremamente globalizada, logo, as pressões devem voltar e devem voltar logo”, avalia Matos.
Na mesma linha, o economista Daniel Frainer comenta que existe um esforço por parte do Banco Central na questão de controle de preços, mas que as tarifas favoreceram nesse quesito. “Teve uma enxurrada de produtos que ficaram retidos no mercado interno e não foram exportados para aquele país. Isso fez-nos ajudar a controlar mais a inflação, inclusive no âmbito de criar uma certa crise em relação ao dólar. E nós temos uma valorização recente do real e isso só nos favorece. Cada vez que o real valoriza, ele ajuda, principalmente, na inflação de custos”, detalha, e completa. “Campo Grande tem uma peculiaridade, nós importamos muita coisa, então aqui a inflação acaba tendo, vamos dizer assim, uma resistência maior às medidas que são tomadas no âmbito nacional, e isso faz com que a gente tenha uma certa dificuldade para, em um primeiro momento, ver essas reduções acontecendo”. “Primeiro, acontece uma redução no atacado, e aí, depois, essa é transmitida por varejo, e isso claro que depende do esforço também dos empresários, de estarem repassando esses ganhos deles para os consumidores, o que na maioria das práticas não acontece, eles acabam retendo isso sob o pretexto de que eles já estão com os preços defasados”, finaliza Frainer.











