Decisão do ministro Flávio Dino considera imprescritível enriquecimento ilícito e abre caminho para condenações; ex-fiscal e ex-deputado Beto Mariano foi demitido pelo governo estadual
O Supremo Tribunal Federal (STF) assegurou a retomada de uma ação civil pública contra ex-dirigentes da Agência Estadual de Gestão de Empreendimentos (Agesul) e da Secretaria de Obras Públicas de Mato Grosso do Sul, investigados na Operação Lama Asfáltica. A decisão, de relatoria do ministro Flávio Dino, acolheu tese do Ministério Público Estadual (MPMS) de que o enriquecimento ilícito e o consequente ressarcimento aos cofres públicos, quando decorrentes de conduta dolosa, são imprescritíveis.
O entendimento afasta definitivamente a alegação de prescrição que havia levado à extinção do processo e garante o prosseguimento da ação, que agora retornou ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) para julgamento do mérito. Com a nova base legal, os réus poderão ser condenados às sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa, incluindo perda de bens, suspensão de direitos políticos e ressarcimento integral ao erário.

A decisão do STF transitou em julgado no fim de setembro, marcando um novo capítulo em um dos maiores escândalos de corrupção do estado.
Em fevereiro de 2024, oito anos e meio após a deflagração da operação – que resultou na prisão do ex-governador André Puccinelli –, o Governo do Estado demitiu “a bem do serviço público” o ex-deputado estadual e então fiscal de obras Wilson Roberto Mariano de Oliveira, o Beto Mariano, e outros fiscais da Agesul.
Beto Mariano, que também foi prefeito de Paranaíba, foi apontado como um dos principais responsáveis por supostas fraudes em licitações de contratos milionários para construção de rodovias. A resolução de demissão, assinada pelo controlador-geral do Estado, Carlos Eduardo Girão de Arruda, citou que Mariano já havia sido exonerado anteriormente em outros processos administrativos – uma vez em 2020 e outra em julho de 2023 –, mas conseguira reverter as decisões na Justiça.
No mesmo ato, foram demitidos os fiscais Átila Garcia Gomes Tiago e Maxwel Thomé Gomez, também acusados de participação no esquema.
Beto Mariano e familiares chegaram a ser condenados em primeira instância por enriquecimento ilícito e improbidade administrativa, por não comprovar a origem de R$ 2,9 milhões investidos na aquisição de duas fazendas, lotes em condomínio de luxo, um apartamento e valores em conta bancária. Na ocasião, a família foi condenada ao pagamento de R$ 19,5 milhões aos cofres públicos.
No entanto, a sentença foi anulada por desembargadores do TJMS, que entenderam haver vícios no processo. Situação semelhante ocorreu com outras condenações na Lama Asfáltica, após o juiz federal originalmente responsável pelo caso, Bruno Cezar da Cunha Teixeira, ser considerado suspeito. Em junho de 2022, uma nova juíza assumiu os autos, e parte das denúncias voltou a tramitar.
O esquema e a operação
A Operação Lama Asfáltica, deflagrada em 2015, revelou um amplo esquema de corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo fraudes em licitações, superfaturamento de obras públicas e desvio de recursos federais e estaduais. O prejuízo estimado supera R$ 500 milhões.
Segundo o MPMS, investigações apontaram que, entre 2009 e 2015, houve evolução patrimonial incompatível com a renda declarada de ex-servidores, com aquisição de imóveis e fazendas que ultrapassaram R$ 3 milhões, além de vultosos depósitos bancários sem origem lícita identificada.
Beto Mariano, considerado “braço direito” do então secretário de Obras Edson Giroto, chegou a ficar preso por quase um ano, acusado de integrar organização criminosa que também incluía o empreiteiro João Amorim e o ex-governador Puccinelli. Eles teriam desviado mais de R$ 300 milhões dos cofres públicos.
Agora, com o aval do STF à imprescritibilidade do enriquecimento ilícito, o caso retoma fôlego no TJMS, reacendendo a expectativa de responsabilização após quase uma década de idas e vindas judiciais.











