A Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes de Defraudações, Falsificações, Falimentares e Fazendários (Dedfaz) da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul abriu inquérito para apurar a suposta falsificação de documento público e uso de documento falso em material protocolado pela Biosev S.A. A empresa, na época dos fatos, pertencia à Raízen, uma das gigantes na produção de etanol e bioenergia no Brasil. Os documentos teriam sido usados em um processo no Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul).

A investigação teve início a partir de uma solicitação da Corregedoria da Reitoria da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), que identificou a falsificação de documentos supostamente emitidos pela Coleção Zoológica da instituição. As declarações em questão são datadas de 11 de novembro de 2024.
Um dos documentos declarava: “Declaro que a coleção zoológica de referência da UFMS receberá para tombamento os lotes de exemplares da fauna terrestre das comunidades terrestres, comunidades aquáticas e flora terrestre a serem coletados durante o projeto ‘Monitoramento ambiental das comunidades terrestres na área de influência do empreendimento Raízen S.A. – Filial Passa Tempo’, de responsabilidade de Sílvia Maria Albuquerque de Souza”.

O segundo documento apresentava a mesma redação, mas se referia à filial Rio Brilhante da empresa. O texto ainda complementava: “Comprometo-me a destinar à Coleção Zoológica de Referência da UFMS, tão logo termine o referido projeto, os exemplares dos grupos taxonômicos acima citados como parte do processo de legalização da atividade de coleta de organismos terrestres junto ao Imasul. Estou ciente que o não cumprimento dessa rotina implicará em comunicado ao Imasul e demais providências”. Ambos os documentos traziam as assinaturas de Sílvia Maria Albuquerque de Souza e de Gustavo Graciolli.

A Investigação
Os documentos foram encaminhados à Gerência de Recursos Pesqueiros e Fauna do Imasul, onde técnicos desconfiaram da sua autenticidade e acionaram a UFMS. A universidade, por meio de sua Corregedoria, não reconheceu a validade dos papéis anexados pela Raízen ao processo ambiental.
A UFMS apresentou uma série de inconsistências:
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A emissão de cartas de anuência deve ser feita exclusivamente pelo e-mail institucional da Coleção Zoológica, e não há qualquer registro da emissão dessas declarações. O último contato com a Biosev havia sido em 2019.
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A estética, o logotipo da UFMS e o padrão do documento investigado não correspondem aos modelos oficiais utilizados pela universidade.
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O documento falsificado utilizava a nomenclatura antiga da unidade, “Coleção Zoológica de Referência da UFMS”, que foi alterada para “Coleção Zoológica da UFMS” em 2019.
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Gustavo Graciolli, cuja assinatura consta no documento, foi dispensado das funções de curadoria da Coleção Zoológica em 2021.
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As assinaturas no documento eram manuais, prática que foi substituída pela assinatura digital via sistema SouGov a partir de dezembro de 2023 – ou seja, incompatível com um documento datado de 2024.
Diante das irregularidades, a UFMS encaminhou o caso à Corregedoria, que solicitou a abertura do inquérito policial. O caso está sob a responsabilidade da delegada titular da Dedfaz, Ana Luiza Noriler da Silva Carneiro.
A investigação deve seguir com a submissão de Gustavo Graciolli e Sílvia Maria Albuquerque de Souza a exames periciais para a conferência da autenticidade de suas assinaturas nos documentos. Não há informação, no momento, de que representantes da Raízen serão intimados no inquérito.
As apurações foram formalizadas pela Polícia Civil no dia 9 de outubro deste ano. A UFMS optou por encaminhar o caso à Polícia Civil, seguindo orientação da Polícia Federal, uma vez que a suposta fraude ocorreu em um processo do Imasul, órgão estadual.
Mudança no Controle das Usinas
É importante ressaltar que as usinas Rio Brilhante e Passa Tempo, citadas nos documentos, não pertencem mais à Raízen. Elas foram vendidas para a Cocal em agosto deste ano, em um negócio que atingiu R$ 1,54 bilhão. Juntas, as unidades possuem capacidade de moer 6 milhões de toneladas de cana-de-açúcar por safra.
Em nota, a Raízen informou que “tomou conhecimento da situação mediante consulta aos fatos e que, até o momento, não foi notificada do inquérito”.











