Solenidade proposta pelo vereador Professor Pedrinho Junior exaltou a atuação de pessoas negras em prol do município

Pelo segundo ano, o dia 20 de novembro celebra, nacionalmente, o Dia de Zumbi e Dia da Consciência Negra. Em 1971, a data ficou conhecida como marco de resistência e luta pela liberdade da cultura afro-brasileira. Porém, o feriado nacional foi decretado apenas a partir de 2023, após a sanção da Lei nº14.759/23. E foi nesse propósito que o vereador Professor Pedrinho Junior propôs uma solenidade, na noite desta terça-feira (18), para entrega de Diplomas “Zumbi dos Palmares”, honraria concedida a personalidades e instituições que se destacam na luta pela igualdade racial e na valorização da cultura afro-brasileira em Três Lagoas.

Estavam presentes os vereadores: Tonhão, presidente da Câmara; Professor Pedrinho Junior, propositor; Sargento Rodrigues, líder do poder executivo; Daniel da Farmácia; Evalda Reis; Mário Grespan; Mi do Santa Luzia; Professora Maria Diogo; Robson do Alinhamento; e Sirlene. Membros do Conselho Municipal dos Direitos do Negro (CMDN) também se fizeram presentes: José Bento de Arruda, presidente; Cláudio César de Alcântara, vice-presidente; e o advogado Dr. Cleitinho, membro. Outras autoridades também vieram prestigiar a solenidade: professora Cidolina Silva; o ex-vereador Idevaldo Claudino, criador da honraria “Zumbi dos Palmares”; e o ex-vereador Professor Nego Breno.
Receberam o diploma: Adriano Estevão Barbosa Rodrigues, Andréia da Silva Santos, Cláudia Bazan, Jaqueline Freitas Azevedo, João Soares da Silva, Marcos Nunes da Silva, Maria Aparecida Cordeiro, Nair Rodrigues de Souza Oliveira, Patrick Carlos Corrêa e Pedro Machado Gonçalves Junior (“Pedrinho Junior”).
Jaqueline Azevedo usou a tribuna em nome dos homenageados fazendo um discurso lindo, poético e extremamente necessário. Uma verdadeira aula para os presentes, a qual compartilhamos na íntegra:
Por Jaqueline Azevedo
Hoje, nesta sessão solene, eu não estou só. Aqui comigo estão Zumbi dos Palmares, símbolo maior de liberdade. Está Dandara, a guerreira que enfrentou exércitos pela vida do seu povo. Está Carolina Maria de Jesus, mulher negra, forte, que abriu caminhos com resistência silenciosa. Está Mestre Bimba, que transformou dor em arte, perseguição em movimento, e elevou a capoeira ao mundo. Está MarieIle Franco, que ecoa em cada luta nossa, lembrando que não vão nos calar. E comigo também estão meus ancestrais — aqueles que vieram antes, carregaram o peso, enfrentaram a violência, sobreviveram para que eu pudesse estar de pé aqui hoje.
Receber o Diploma Zumbi dos Palmares não é prêmio: É responsabilidade. É continuidade. É compromisso com a luta que começou muito antes de mim. É honrar cada passo que foi dado com os pés descalços sobre a terra dura deste país.
Sou assistente social há 16 anos e atuando há 14 anos; professora da educação infantil há 15 anos e atuando há 5 anos; e mulher negra num Brasil que ainda insiste em nos chamar de parda para suavizar a cor que carregamos com orgulho. Eu sei o peso e a beleza dessa pele. Eu sei o que significa entrar numa sala, numa repartição, numa loja, numa entrevista de emprego… e ser lida, julgada e medida antes mesmo de abrir a boca.
E ainda assim, sigo. E ainda assim, luto. Nas duas áreas em que atuo — assistência social e educação — eu sempre busco combater o racismo de frente. E na educação, onde existe uma lei que garante o ensino da história e cultura afro-brasileira, faço essa lei viver. Porque lei no papel não transforma. O que transforma é coragem. O que transforma é voz. O que transforma é presença, firmeza e consciência.
Com as crianças, eu não apenas ensino conteúdos. Eu ensino identidade. Eu ensino pertencimento. Eu ensino que a África pulsa no Brasil todos os dias:
- Pulsa nas palavras que brotam da nossa boca: moleque, banana, canjica, cuscuz.
- Pulsa nos ritmos, nos tambores, nos movimentos da capoeira.
- Pulsa nos turbantes, nos colares, nas tranças — que já foram mapas de fuga para quilombos.
- Pulsa nas abayomis, nos afetos tecidos à mão.
- Pulsa nos sabores da nossa mesa: acarajé, tapioca, angu, cuscuz.
- Pulsa nas brincadeiras que atravessaram o oceano: amarelinha africana, terra-mar, tantas outras.
África está em nós. África nos construiu. África nos sustenta. Mas, mesmo estando em tudo, ficamos por anos sem nenhum privilégio, apagados, silenciados, empurrados para a margem. E, por isso, aprendemos que precisamos nos esforçar três vezes mais para sermos vistos, aceitos, respeitados. E, por isso também, ensino às crianças que certas palavras, ainda tão comuns — mulata, inveja branca, aquele pretinho — não são brincadeiras: são feridas. Feridas que precisamos parar de abrir.
Eu acredito na educação como ponte. Eu acredito no afeto como ferramenta. Eu acredito na resistência como destino. Este momento aqui, hoje, significa muito. Porque esta bandeira que eu levanto — a da educação antirracista, da dignidade do povo negro, do orgulho ancestral — não será abaixada.
Ela seguirá erguida enquanto houver injustiça, desigualdade, silenciamento. Ela seguirá erguida por mim e por todos que vieram antes. Que os nossos ancestrais sintam que estamos dando continuidade ao que eles começaram. Que saibam que a luta não vai cessar. Porque nós somos a geração que não se cala mais. Porque nós somos a geração que planta e colhe. Porque nós somos a geração que vibra e transforma.
E termino afirmando aquilo que me guia, que me sustenta e que me convoca: “UBUNTU. Eu sou porque nós somos”. E nas palavras eternas de Nelson Mandela, que iluminam nossos passos: “A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo”.
Muito obrigada.
José Bento, reforçou que ali não estavam quaisquer homenageados, mas sim, pessoas que lutam diariamente para sobreviver, uma luta longa e árdua. O presidente do CMDN também deu uma aula de história, contando sobre a Zumbi dos Palmares, sobre as lutas que o povo negro, afro-brasileiro sofreu e sofre até hoje. Por exemplo, ele lembrou que a história das favelas no Brasil está ligada não só à urbanização desordenada: “a primeira favela, o Morro da Providência, surgiu no Rio de Janeiro em 1897, após o fim da Guerra de Canudos, com soldados que não receberam as terras prometidas e se instalaram em um morro. O nome ‘favela’ foi adotado devido a um morro no interior da Bahia que se parecia com o local onde os soldados haviam se abrigado e que tinha o nome de Morro da Favela”.
Por fim, o vereador proponente encerrou o evento citando alguns dados lamentáveis: “vivemos no país que mais praticou a escravidão, trazendo, na época, cerca de cinco milhões de africanos, 44% de todos os africanos trazidos para as américas. E, por 388 anos, condenou o povo negro, causando toda essa tristeza que nosso povo, nossos ancestrais sofreram”. Professor Pedrinho Junior ressaltou: “nossa luta não é contra nossos irmãos brancos, a nossa luta é por direitos raciais, direitos que nos foram tolhidos por anos e que as pessoas, muitas vezes, nos oferecem como um ‘favor’, mas não são favores e sim nossos direitos”.
Emocionado, Pedrinho demonstrou sua felicidade por ver tanta gente de cor ali no plenário: “sinto falta da minha gente quando estou aqui nas sessões ordinárias. Por isso, espero que o dia 20 de novembro, seja um dia para chamar de ‘nosso’, mesmo que um dia seja pouco diante de toda nossa história. Continuaremos lutando! Essa noite de hoje é mais um dia da nossa luta”, encerrou
HISTÓRIA
Celebrar a Consciência Negra é reconhecer o passado, compreender o presente e agir para transformar o futuro. Que estas narrativas fortaleçam nosso compromisso coletivo com um ambiente público mais inclusivo, respeitoso e representativo. A data, apesar de ser concebida em 1971, foi formalizado nacionalmente em 2003, com a Lei nº10.639/03, que torna obrigatório o ensino da história afro-brasileira nas escolas. Depois, em 2011, a ex-presidente Dilma Rousseff, oficializou a data como Dia Nacional de Zumbi dos Palmares e da Consciência Negra. Apenas em 2023 é que foi decretado feriado nacional.
A data (20 de novembro) é uma contraposição ao 13 de maio, data de assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel, e faz referência ao dia atribuído à morte de Zumbi dos Palmares, em 1695, com o propósito de ressaltar o protagonismo das pessoas negras.
Zumbi foi um dos maiores líderes negros do Brasil que lutou pela libertação do povo contra o sistema escravista. Sendo assim, a data, dentre outros temas, suscita questões sobre racismo, discriminação, igualdade social, inclusão de negros na sociedade e a cultura afro-brasileira, assim como a promoção de fóruns, debates e outras atividades que valorizam a cultura africana.











