Tragédia no Zoológico: Jovem com histórico de vulnerabilidade morre ao invadir recinto de leoa em João Pessoa

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Caso expõe falhas na rede de proteção, desafios no atendimento à saúde mental e reacende debate sobre segurança e responsabilidade social

 

A morte do jovem Gerson de Melo Machado, de 19 anos, conhecido como Vaqueirinho, no Parque Zoobotânico Arruda Câmara (Bica), no último domingo (30), vai além de um incidente isolado. A tragédia, investigada pela polícia, desenha um triste retrato de vulnerabilidade social, transtornos mentais não suficientemente assistidos e um ato impulsivo com desfecho fatal.

De acordo com as autoridades e a administração do parque, Gerson invadiu o recinto da leoa por volta do meio-dia. Ele escalou uma parede de mais de seis metros e ultrapassou barreiras de proteção até alcançar a área interna onde o animal estava. Visitantes, em choque, registraram cenas do momento em que o jovem adentrou o espaço. A leoa, reagindo de forma instintiva à invasão de seu território, atacou-o, causando ferimentos que levaram à sua morte.

A história de Gerson era conhecida pelos serviços sociais. Sua trajetória de vida ilustra os limites da rede de proteção. Aos 10 anos, ele foi acolhido pelo Estado após ser encontrado sozinho em uma rodovia federal. Em 2023, registros de atendimento em serviços de saúde atestavam diagnósticos de esquizofrenia e deficiência intelectual.

Apesar do acompanhamento, relatos de pessoas próximas indicam que o jovem nutria uma fascinação por animais selvagens e frequentemente comentava sobre o desejo de viajar para a África. Especialistas que analisam o caso sugerem que essa fixação, somada à sua condição de saúde mental não estabilizada, pode ter sido um fator crucial para a decisão fatal de invadir o recinto.

Investigação e Repercussões
A Polícia Civil investiga a dinâmica completa do caso. A Prefeitura de João Pessoa abriu um procedimento administrativo para analisar eventuais falhas de segurança no zoológico. Em nota, a administração do parque afirmou que o recinto da leoa segue todas as normas técnicas vigentes e que a estrutura ultrapassada pelo jovem atende aos padrões nacionais. Foi decidido que a leoa envolvida no ataque não será sacrificada, uma vez que não fugiu de seu ambiente e agiu por instinto diante de uma invasão.

A morte de Gerson reacendeu debates urgentes na sociedade paraibana. Assistentes sociais, psicólogos e defensores de direitos humanos destacam que casos como este evidenciam desafios estruturais.

“Esta tragédia é um sintoma grave. Fala sobre a fragilidade do sistema de acolhimento após a maioridade, sobre a dificuldade de oferecer um tratamento contínuo e eficaz para transtornos mentais complexos em jovens vulneráveis, e sobre a integração falha entre as políticas de saúde, assistência social e proteção”, analisa a professora de Serviço Social da UFPB, Ana Lúcia Ferreira.

A discussão também se volta para a capacidade das instituições – sejam de saúde, assistência social ou mesmo de lazer, como o zoológico – de identificar e lidar com situações de risco envolvendo pessoas em crise. A pergunta que fica é: como uma sociedade pode se organizar para proteger seus membros mais frágeis e evitar que desejos impulsivos, potencializados por doenças não tratadas adequadamente, terminem em tragédia?

O corpo de Gerson foi liberado para seputamento. Enquanto a investigação técnica segue seu curso, sua história se torna um triste emblemade lutas invisíveis e de um sistema que, apesar de existir, nem sempre consegue conter as quedas daqueles que mais precisam.

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Edição 268